Por José António Meneses, Especialista em Segurança / Director de Segurança e Vice-presidente da Associação de Directores de Segurança de Portugal
No que à segurança em Portugal diz respeito, é disto que temos vivido e teimamos viver! Senão vejamos:
Primeiro, começa-se por criar a convicção nas pessoas de que Portugal está entre os três países mais seguros do mundo, quando em 2017 teve a quinta maior taxa de assaltos da UE, segundo dados divulgados pela Eurostat 1. Como vivemos do turismo, interessa-nos que assim seja! Interessa-nos que os dados sobre a criminalidade, que constam no Relatório Anual de Segurança Interna, continuem em baixo, nem que para isso seja necessário tornar crimes que eram de natureza semipúblicos para dependerem de acusação particular, para, desta forma, afastar grande parte dos crimes deste indicador, uma vez que os custos associados para levar um processo desta natureza a tribunal, são, regra geral, bastante superiores ao valor da “lesão” provocada ao eventual denunciante.
Depois, adoptamos medidas de cosmética, sem qualquer utilidade e com custos elevados para o erário público, após acontecimentos que assumam muita visibilidade, visando, principalmente, a obtenção de dividendos políticos! Bom exemplo disto foi a reacção aos atentados terroristas de Nice e Barcelona, em que tivemos de criar a ilusão de que em Portugal isto nunca se vai passar, colocando, apressadamente e sem um planeamento eficaz, tendo em conta as características de comércio e de mobilidade daqueles locais, uma espécie de barreiras de detenção de viaturas, através de blocos de cimento e pinos amovíveis, complementados com baias, também amovíveis, em zonas turísticas, como, por exemplo, Belém 2 . Hoje em dia vamos a esses locais e os pinos que supostamente deviam impedir o acesso ao passeio marítimo, têm de estar constantemente em baixo, uma vez que os fornecedores têm de aceder àqueles locais que têm muita restauração. Resumindo, eficácia zero, só estamos à espera que alguém se lembre…
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Para finalizar, no seguimento do aumento da publicidade dada aos casos de violência nos hospitais, foi criado um gabinete “gabinete de segurança para a prevenção e o combate à violência contra profissionais de saúde”, composto por um oficial da PSP, um da GNR e um terceiro membro a designar. Este gabinete tem como missão, de entre outras, colaborar na avaliação do problema (falta de segurança), através da realização de um diagnóstico da situação actual, de um levantamento de locais e respectivas características físicas, numa perspectiva de segurança e detecção precoce de factores de risco e perigo de ocorrência; emitir recomendações adequadas à melhoria das condições de segurança; apoiar a implementação de mediadas necessárias; recomendar o estabelecimento de prioridades de intervenção e parcerias com outros ministérios, autarquias e entidades públicas e privadas, etc. Agora, num mandato de 3 anos, vamos ter 3 pessoas que saem dos seus serviços de origem, eventualmente com prejuízo para as corporações a que pertencem, a tentar desempenhar as tarefas referidas, em todos os hospitais a nível nacional, emitindo recomendações (não vinculativas) e acompanhando a eventual aplicação das mesmas (para quem acredite que em 3 anos, 3 pessoas consigam fazer tudo isto). Portanto, das duas uma, ou o gabinete torna-se num super gabinete, à semelhança de outros que têm agentes/guardas/inspectores (em permanência) e oficiais de diversas Forças e Serviços de Segurança, visto uns não terem acesso aos sistemas de outros, ou, ao fim de três anos, estará tudo na mesma e este gabinete não terá servido para nada mais, que não “encostar” um ou outro elemento. Já agora, tem surgido um aumento de casos divulgados de violência contra os professores e outros profissionais de acção educativa, iremos criar um gabinete para estudar esta problemática? Ah, é verdade, já existe o programa “escola segura”, que visa exactamente isso “…garantir segurança, prevenindo e reduzindo a violência, comportamentos de risco e incivilidades, bem como melhorar o sentimento de segurança no meio escolar e envolvente, com a participação de toda a comunidade, o acompanhamento da violência em ambiente escolar…”.
Enfim, enquanto nesta matéria, tal como noutras, andarmos a reagir e legislar atrás de mediatismos, andamos a dar paliativos a situações que exigem medidas de fundo e ponderadas, criando a ilusão de que as resolvemos! Enquanto noutros países desenvolvidos esta temática é encarada como “Corporate Security”, em que existem directores de segurança, devidamente formados e credenciados, que são responsáveis por desenvolver, implementar e gerir planos de segurança para cada local, salvaguardando todas as questões, quer sejam de Safety ou Security, aqui andamos a reboque de acontecimentos que geram populismos! Imaginem que amanhã há um incêndio num hospital que origina uma série de vitimas, vamos adicionar um bombeiro ao dito gabinete?
1 https://www.publico.pt/2019/10/31/sociedade/noticia/portugal-5-maior-taxa-assaltos-ue-2017-1892022
2 https://tvi24.iol.pt/sociedade/chiado/camara-de-lisboa-reforca-barreiras-de-seguranca